Telégrafo e Superagüi
Um novo site requer uma publicação para voltar com tudo. Dessa vez nós voltamos com tudo mesmo, com tudo cheio de areia, de barro, de água do mar - uma desgraça só...
O Parque Nacional do Superagüi (sim, sim - no momento de escrever este texto também nos perguntamos se nomes próprios vão permanecer com trema pelo novo acordo ortográfico... mas você vai ver que trema não faltou nessa viagem: chegamos com tudo solto em casa!) sempre foi um sonho para nós (não desde pequenos, naquela época era café-com-leite, digo, de goiaba o sonho, freguesia). Em função das inúmeras travessias necessárias para se conhecer a região, sempre postergávamos a expedição. Mas dessa vez saiu! Saiu da centragem a roda, saiu do Paraná e saiu correndo na praia de nudismo do Superagüi.
- Nota
- Se você acha que o editor nº 1 se manifesta de forma imprópria ao atribuir o conceito naturalista (pelado mesmo) à referida praia deserta, saiba que impropriedade mesmo foi a realização da prática ciclonudista (pelado mesmo) pelo referido editor. Pormaisque o editor vos redige esta nota também tenha praticado (pelado mesmo). Ah, vai dizer que você nunca quis pedalar pelado? Não? Não mesmo? Mas ler o nosso site só de cueca pode, né? (da próxima vez desliga a webcam...)
Capítulos
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1Travessia de Barco 1 dia 95 kmDIA 1 curitiba, paranaguá, guaraqueçaba
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2Trilha do Telégrafo 1 dia 68 kmDIA 2 guaraqueçaba, batuva, trilha do telégrafo, ariri
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3Parque Nacional do Superagui e Ilha das Peças 1 dia 42 kmDIA 3 ariri, superagui, ilha das peças
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4Um estouro de emoções 1 dia 89 kmDIA 4 ilha das peças, paranaguá, curitiba
O verão. Ah, o verão! Esse suspiro foi somente para expressar a instabilidade que nos acercou no primeiro dia de viagem (e nos três últimos também). Seguindo pela BR277, uma pequena parada na serra para tomar café e seguimos para a mais antiga cidade do estado - Paranaguá. Quase 13h e já embarcávamos (em um barco mesmo - embora use-se "embarcar" para ônibus e avião, o que é estranho, se fosse enaviãozar ou enônibuzar ficaria mais de acordo (não esse último, o ortográfico)) sentido Guaraqueçaba.
O tempo estava aparentemente estável, bicicletas no teto do barco (tecnicamente amarradas) e seguimos pela baía de Paranaguá. Começa a famosa parte “com emoção”, não-emo-somos. Desanda um temporal e o barco começa a balançar (ai, minhas coisas no alforje! acho que tá lavando tudo). As conversas felizes que podíamos ouvir já se convertem em rostinhos verdes. Mas, afinal, para que se preocupar, o marujo comenta lá dentro: Ainda bem que temos GPS, tem uns 8 barcos perdidos na baía (GPS salvador!).
Muita cachoalhada depois (o que representa cerca de 3:30h), chegamos ao destino. Até que a travessia na chuva não estava tão ruim, o problema foi descer na chuva e se unir à bicicleta molhada. A chuva passou e o lulis deu uma sugestão: vamos procurar a “Pedra Roliça”!
- Nota esclarecedora sobre a pedra-roliça-por-favor
- Alguém sabe o que é essa pedra roliça, afinal?
A saída do caminho para pedra-roliça é na entrada da cidade. Relembrando o projeto Salto Morato, entramos novamente em Guaraqueçaba pela porta dos fundos. Mais algumas voltas por toda a cidade (tá, isso não é muito), resolvemos procurar um lugar para ficar. Analisando as opções e as condições, aterrissamos na Pousada Ferreira. Hospedagem em Guaraqueçaba é barato para quem só quer o básico. Com certeza vale mais a pena do que um camping em Itapema - vide experiência em no projeto Floripa...
No café-da-manhã o Sr. Ferreira nos contou que no final de semana anterior havia ocorrido o pior temporal em cerca de 2 décadas, devastando toda a região. Nessa hora não sabíamos se era melhor ficar felizes ou tristes. Felizes porque já tinha passado, mas tristes porque enfrentaríamos o resultado de tudo isso. Tá, é claro que ficamos tristes pelo povo humilde de lá, que já faz milagre para sobreviver e nessas horas ainda perde o pouco que tem. Mas aposto que naquela altura eles também estavam felizes porque o pior já tinha passado!
Na estrada de Guaraqueçaba já deu para notar: muitas pedras. Muito mais pedras do que estrada em si, fator crítico para cicloturistas. Um pouco para frente da cidade um desmoronamento “recém ajustado”.
Logo começava o trecho que seria totalmente desconhecido. Em um cruzamento seguimos sentido norte, para a localidade de Batuva. Nessa hora nos lembramos das caminhadas em rios. Sabe aquele rio bem raso que tem pedras no fundo, mais arredondadas (até porque são pedras de rio), estilo Nhundiaquara (para quem conhece Morretes). Então, imagine aquilo sem água e sendo chamado de estrada: É o acesso de Guaraqueçaba para Batuva.
- Nota das novas regras do Português
- Estávamos discutindo sobre a presença da trema no nome Superagüi, mas nessa hora, depois de pedalar a estrada acima referida, tivemos certeza que Batuva tem trema, trema pra caramba, vai lá pra ver se não trema! Trema tudo!
O sol animou a pedalada pelo meio da Serra do Mar. Na localidade, paramos para não cozinhar no sol (nunca tá bom, né, nunca tá bom). Coletamos a informação preciosa de que o “acesso rústico” para São Paulo era a próxima carreirinha à direita.
- Nota onomatopéica
- hahaha. Hahahehh. Haha.. carreirinha... hahhaha caminho para são paulo... ahahah carreirinha.. hehe... carreirinha?
A partir daquele momento começava: A temida, molhada, enlameada, medicinal… Trilha do Telégrafo.
- A Trilha do Telégrafo
- LAMA!! Lama!! Tá bom, já deu para entender na história. A trilha tem esse nome porque antigamente passava a linha do telégrafo pelo lugar - que ainda pode ser visto em alguns trechos. Saindo de Guaraqueçaba, são 8km pela PR405 até chegar em um cruzamento que dá acesso à estrada de Batuva. Mais 15km e chega-se até o início da trilha na própria localidade. A trilha em si compreende cerca de 6km. É muito conhecida na região pelos “desafios de moto-cross”. É bicicletável em alguns trechos, mas praticamente empurrável na maioria deles. O lugar é sem dúvida muito bonito e inóspito. A divisa de PR com SP é marcada pela placa de entrada do Parque Estadual de Jacupiranga.
- A trilha acaba em uma escola, onde já existe acesso para carros. Mais 7km e está a Estrada Cananéia – Ariri. Seguindo ao primeiro destino é possível seguir por São Paulo até chegar nas grandes rodovias, como a br116, de volta a Curitiba. No sentido Ariri, chega-se à uma pequena cidade portuária (Ariri, por acaso no fim da linha), conhecida como destino dos praticantes de pesca por lazer.
Tire as crianças da frente do computador porque vai voar barro! Mas o que pode ser tão ruim numa trilha se, afinal, já pedalamos tanto por esses lugares? Pode ser ruim porque havia uma semana que o mundo tinha caído na região - e não sobrou árvore sobre pedra. Na medida em que o tempo passava ficava mais difícil acreditar que estávamos no caminho certo. Só mesmo o GPS pra dizer: o vetor é esse, vai lá gurizada! Lama quente até o joelho é um saco (mas dizem que é medicinal).
Para não dizer que não fizemos o melhor possível, conseguimos errar um trecho. Em função das chuvas, uma ponte caiu no meio do caminho. Bem, "caiu" é jeito de falar: a chuva levantou a ponte e a levou para adiante, então na verdade subiu... A população local já havia criado um desvio, mas não percebemos. Foi “a operação passar bicicletas”. Um pouco mais à frente surge o que um dia deveria ter sido um trecho “calçado”. Um amontoado de toras que, em função da chuva, já estavam totalmente deslocadas. Tudo isso culminou em uma escolhinha (ao menos!) e, logo, estávamos na estrada que liga Cananéia à localidade de Ariri, em São Paulo.
Pelo menos vivos e enlameados, mas não molhados! Ah, que equívoco. Foi só pensar assim para que pegássemos o nosso primeiro grande temporal antes de terminar este dia em Ariri. Mais uma vez, hospedagem em pousada valeu mais a pena que qualquer camping. Sobrou tempo para negociar a nosso traslado para a ilha de Superagüi (traslado de toc-toc trema também!), no dia seguinte.
Tomamos café com o Sr. Claúdio, morador antigo da região que nos contou várias histórias. Foi com ele mesmo que combinamos o traslado para ilha de Superagüi, cerca de 50 minutos. Pelo preço que queríamos, fomos os três com as bicicletas numa pequena voadeira (voadeira que nada, não voa, não. e nem é um cavalo, é um barco). Não há como negar, a água parecia mais perto de nós do que o normal...
Com o mar muito mais calmo que no primeiro dia, fomos desembarcados no primeiro local pedalável. Não dá pra dizer que foi sacanagem, mas em se tratando de ilha deserta, começamos a nos preocupar com algumas passagens pelo mato e rio - afinal, não estávamos ainda na praia deserta.
Logo bateu o desespero. Chegamos em um local que a praia estava tomada por galhos, só era possível transpor por via marítima. Que bom: nós - e nada! - no meio do nada naquela situação - e nada! E, pior, bicicleta não nada! Tá, tá: nada que uma triagem não resolva... O Dú caçou uma trilha pelo meio do mato, alguns metros antes do local tomado pela vegetação, e logo encontrou “a passagem”. A trilha é bem extensa até, chegando finalmente na praia deserta. E com uma larga faixa de areia para pedalar (várias faixas, eu diria).
- Pq. Nacional do Superagüi
- O parque é localizado na região litorânea-norte do Paraná, compreendendo uma área de 339,3 km², dentro do Complexo Estuarino Lagunar (de Iguape em São Paulo até Paranaguá). Os ecossistemas predominantes são: floresta, maguezais e restinga. Dentre as diversas ilhas, as mais visitadas são: Superagüi, Pinheiro, Pinheirinho e Peças.
- Um dos principais atrativos da região é a praia deserta. Possui 38km de extensão de praias virgens, podendo ser visitada a pé ou de bicicleta. Para chegar lá é possível seguir desde a comunidade de Superagüi pela praia ou caminhar na "Trilha da Lagoa". Essa última possui 3km, onde é possível observar uma formação de restinga com muitas bromélias, diferentes tipos de líquenes, orquídeas e outras espécies.
- O único local onde é permitido pernoitar em toda ilha do Superagüi é na própria comunidade; nos outros locais é permitido apenas transitar.
Fonte: Ibama.
Praia deserta? Isso existe? Sim! Uma extensa praia deserta onde aproveitamos para fazer o nosso primeiro pedal ciclonudístico (provavelmente o último, o limite entre o hilário e o bizarro é muito sutil). Logo surgiram travessias dos rios que desaguam no mar. Em função das chuvas, o volume de água estava anormal (no sentido literal da palavra, não o pejorativo), o que simplesmente deu medo. Finalmente, a comunidade de Superagüi.
- Nota de revisão de roteiro
- O destino final era aqui, mas pela proximidade da Ilha das Peças (visível da praia), resolvemos trasladar mais uma vez e pedalar mais uma praia deserta.
Depois do almoço pegamos um toc-toc (quem bate?). É um tipo de barco que faz um barulho traduzido onomatopeicamente por “toc-toc” (isso mesmo - e tecnicamente, como um bom garagista (humn), o thiago explicou que é por causa do motor “estacionário”, super-mega-ultra-econômico e lento).
A travessia dura cinco minutos. A praia da ilha das peças é tão bonita quanto a do Superagüi, e ainda tem um “plus”: a medida que contorna a ilha, consegue identificar a ilha do mel lentamente de longe, até chegar bem próximo (com o oceano no meio, obviamente) à Fortaleza (não no nordeste, mas sim a localidade dentro da própria Honey Island).
O centro da ilha das peças não tem nada de deserto e calmo. Com muitas lanchas e iates, a praia dali é o “programa de final de semana” de muitos parnanguáras (o termo “centro” é aqui usado para distinguir o local com maior aglomeração de casas da praia deserta).
Procurando um camping conhecemos o singular Sr. Sátiro Martins (não, ele não é um camping, é o proprietário). Ele possui uma casa de veraneio na ilha e resolveu montar o camping porque recebia muitos parentes em sua casa. Achou uma alternativa melhor para hospedar o pessoal! Acomodados, recebemos o convite para observar a sua pesca artesanal a um peixe chamado “parati”.
Depois de entrar no mar e observar a colheita marítima, aprendemos a preparar o, segundo ele, famoso “Parati Selvagem”, que inclusive deu origem ao nome do camping. A janta foi engraçada e inóspita, comendo parati selvagem e siri (cansamos mais de tentar comer estes últimos (os siris, ora!) do que vir pedalando de Ariri (até porque viemos de barco um bom trecho)). Ainda deu tempo de provar a Cataia. É uma folhinha curtida na cachaça, que o pessoal toma muito por lá. Dizem que é afrodisíaco, mas a gente descobriu que é cachaça mesmo. E forte. De verdade.
Durante a noite choveu (imprevisível) e acordamos ilhados na ilha das peças (alguma novidade até aqui?). Despedidas a parte, o tempo já começou fechado (ao contrário dos outros dias) e seguimos para o trapiche, o destino seria novamente Paranaguá. Mais uma travessia, dessa vez mais curta que a primeira - e mais calma também.
- Nota para cicloturistas em travessia
- Sempre que for fazer uma negociação para travessias, não questione o valor cobrado pela bicicleta. Pelo menos não no primeiro momento. Como as pessoas levam muitas coisas entre essas ilhas, eles não costumam cobrar, a não ser que você, bem “turistão”, pergunte o preço da travessia para a bicicleta. Daí sim, eles cobram :|
Devidamente desembarcados em Paranaguá, só faltava mas uma “esticadinha” até Curitiba, consideravelmente perto e fácil se comparado ao restante da viagem. Antes de mais tudo, calibrar os pneus para o asfalto, afinal, não precisa ficar murcho igual nas estradas de terra.
Eis que o calibrador do posto se revolta contra o uso ciclístico e resolve dar um golpe no pneu do Dú. Por azar, era o thiago que estava enchendo. O equipamento deu “uma bombadona” que superou a pressão máxima permitida, ocasionando um POUUUUUUU (não dos teletubbies, uma onomatopéia de estouro mesmo).
- Nota analítica
- Estouro de pneu na verdade é estouro de câmara. É só pegar uma reserva e substituir. Ok, deixa eu ver aqui... Aro? O que? Arrebentou o aro? Isso mesmo. Agora sim, estamos na merda.
Domingo, cidade de Paranaguá, um aro amassado (amassado? arregaçado!), uma câmara estourada. Nessa hora só gambiarra resolve. Com a ajuda de um borracheiro desamassamos o aro, passamos uma fita crepe para as hachuras do alicate não rasgarem a nova câmara, enchemos o suficiente (pouco mesmo) para o pneu rodar e.. GO HOME! E não é que deu certo?!
- Nota paradoxal
- Ironia pensar que precisávamos de uma bicicletaria logo depois de ter chegado da própria ilha das peças...
Serviços #
Pousada Ferreira - Guaraqueçaba - PR. Av. Ararapira, s/n. Jamil (41)3482-1388.
Pousada Caiçara - Ariri - SP. Pousada, passeios de barco e travessias. Cláudio (13)3852-1107.
Camping Parati Selvagem - Ilha das Peças - PR. É necessário ligar antes confirmando pois Sr. Sátiro Martins, dono do camping, não fica sempre na Ilha das Peças. (41)9674-2745. Contato em Superagui: (41)3482-7148.
Expediente #
texto por Du, maratona-de-construir-o-novo-site por Lulis, video e outras fotos por Thiago.
Pedalado por du, lulis, thiago.
Publicado em 1 mar 2009.